quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Capítulo 11 - Memórias

- Acordou?
Razen abriu os olhos. Um tanto quanto desnorteado, começou a observar o ambiente. Estava em um quarto de hospital, deitado sobre uma cama macia e quentinha. Ao seu lado viu Clay, sentado em uma cadeira, apoiando-se nas mãos e observando o afilhado.
- O que... Aconteceu? – Perguntou finalmente, após observar a sala mais um instante, e a janela ao fundo que suavemente transmitia calor solar para o cômodo.
- Ninguém sabe ao certo, estamos investigando. Você adormeceu filho, exatamente cinco dias atrás. Não conseguíamos acordá-lo, então resolvemos trazê-lo ao hospital. Mas não adiantou muita coisa.
- Adormeci? Como assim?
- Isso foi obra de alguém que quer lhe fazer mal. Eu fiquei ao seu lado durante esses cinco dias, juntamente de Blaze. Você diversas vezes resmungou coisas que...
- Que o quê? – Perguntou Razen, exasperado.
- Que aconteceram conosco. Creio que você reviveu todo o seu passado, em um sonho interminável. Você resmungou sobre Nibelung, sobre Loren, e até mesmo sobre a vez em que você sofreu a primeira Queda com Blaze.
Razen arregalou os olhos, assustado. Lembrou-se de ter mesmo sonhado com tudo o que acontecera em sua vida.
- Foi... Isso mesmo. Mas como pode ter acontecido? Quem teria feito isso?
Clay não respondeu. Acabara de atender o celular, que tocava insistentemente enquanto Razen falava.
- Certo, estamos indo. – Disse Clay, desligando o celular. – É hora de descobrir a verdade, filho.
Pouco tempo depois, a dupla deixou o hospital. Clay conversou com os médicos durante algum tempo, e não teve muitos problemas para liberar o paciente.
No estacionamento, Razen, que continuava confuso e pensativo, perguntou:
- Se eu resmunguei coisas sobre Nibelung... Talvez Blaze já saiba a verdade... Que nós dois matamos o avô dele.
- Ah sim, ele já sabe. Blaze não parece muito preocupado com familiares vampiros... – Respondeu Clay com tranqüilidade, enquanto entrava no taxi para deixarem o estacionamento.
Durante o caminho, ambos permaneceram em silêncio. O dia estava calmo, as ruas pouco movimentadas e algumas poucas lojas abertas aguardando clientes. O Táxi parou em um cruzamento, com o semáforo piscando em vermelho. Dois pedestres atravessavam lentamente. Razen observou algo estranho neles, e comunicou ao companheiro:
- Veja esses dois...
Clay olhou para os pedestres, e arrepiou-se. Era uma dama, portando um longo vestido azulado que arrastava sua cauda lentamente pelo chão, e um rapaz, com um elegante terno branco e gravata vermelha. O casal olhou para a dupla no carro sorrindo alegremente.
- Seimic e Margot... – Sibilou o taxista, olhando o casal de cima a baixo com uma visível inquietação.
- Você não acha muita coincidência? – Perguntou o menino ruivo, encarando Seimic com fúria.
- Acho sim. Vamos sair logo daqui. – Clay pisou no acelerador e atravessou o cruzamento em alta velocidade. Não queria encontrar Loren naquela situação, e acreditava realmente que ele estaria perto do casal.
Algum tempo depois, o táxi estacionou. Estavam em uma rua estreita, sem movimento algum nas calçadas. Clay correu até a casa mais próxima e bateu duas vezes na porta. Atrás dele, Razen lançava olhares para os lados com medo de encontrar algo indesejável. Blaze abriu apareceu abrindo a porta, segundos depois, e pediu para que a dupla entrasse.
Depararam-se com uma sala extremamente bagunçada, com livros empilhados em cima de uma mesa retangular, junto de alguns frascos com gosmas viscosas, e alguns pequenos aparelhos estranhos. Pelo chão estavam espalhados dezenas de mapas sujos e pergaminhos com escritas desconhecidas. A dupla deu uma rápida verificada em tudo com o olhar, meio assustados, e continuaram seguindo Blaze, que permanecia quieto, caminhando pela sala tomando o devido cuidado de não pisar nos mapas. Atravessaram a sala inteira, e pararam ao se aproximarem de uma escada, que descia para um andar subterrâneo. Blaze acendeu o interruptor mais próximo com o polegar, iluminando os pequenos degraus de madeira velha.
- Vamos descer. – Disse, pisando lentamente no primeiro degrau para analisar a resistência.
O trio desceu, com alguma dificuldade, em silêncio. Pouco tempo depois chegaram à outra sala, essa ainda mais suja e desorganizada que a outra. Algumas pequenas teias de aranha misturavam-se às estantes de livro no canto mais próximo. Blaze parou subitamente, e encostou a palma da mão no peito de Clay, fazendo sinal para que não andassem. O caçador caminhou até o centro da sala, acompanhado apenas da fraca iluminação do andar de cima. Parou ao chegar próximo de um sofá, extremamente empoeirado e escuro.
- Está aí, Cyka? – Perguntou baixinho, direcionado ao sofá.
O silêncio permaneceu por mais um instante. Blaze espremeu os olhos na tentativa de enxergar algo próximo ao sofá. Clay e Razen, sem entender muito da situação, observavam a cena parados na entrada da sala. Subitamente, ouviram um miado, longo e pavoroso. Um gato negro, com pêlos extremamente grossos e sujos surgiu, pulando de trás do sofá. O gato parou em frente ao caçador, encarando-o com seus belos olhos esverdeados.
- Eu trouxe o rapaz que lhe falei. O mais novo dos Jacobs. – Blaze virou-se, mostrando Razen, que espantado, acenou com a mão devagar.
- Sem dúvidas, um dos filhos de Larks Jacobs. Sardento, com esse cabelo ruivo capaz de iluminar até mesmo um ambiente sombrio como esse. – Blaze virou-se para encarar o gato, mas ele já não estava mais lá. No seu lugar estava uma jovem moça, de olhos igualmente esverdeados, sorrindo por trás dos lábios carnudos. A moça caminhou até a entrada da sala, o único ponto realmente iluminado, e aproximou o rosto de Razen, segurando em seu queixo com a mão. – Quantos problemas você tem causado, pequenino...
- Vamos subir e conversar lá em cima. Esse tipo de ambiente não me agrada nem um pouco – Disse Blaze, tratando de levar todos para o andar superior.
Clay acomodou-se na cadeira mais próxima e suspirou. Estava tenso, sem entender muita coisa, e ansioso por respostas. Igualmente tenso, Razen cruzou os braços e encostou as costas na parede mais próxima, perto de Clay. A jovem Cyka deu uma breve olhada nos mapas espalhados pelo chão, e voltou a olhar pra Razen.
- Serei breve, já que vocês não têm muito tempo a perder. Meu nome é Cyka, e eu sou a esposa do lendário Heter, o Mago Temporal.
- Mago Temporal? – Perguntou Razen. Blaze e Clay lançaram olhares repreensivos para o menino, que ficou envergonhado.
- Sim. – Respondeu Cyka – O Mago Temporal é conhecido pela sua habilidade de confundir e dominar a mente humana, tendo, portanto a capacidade de deixar um rapaz como você, preso em um turbilhão de lembranças sobre a sua vida, em um sonho interminável.
-Então foi ele o causador de tudo. – Disse Blaze, cerrando os dentes e os punhos.
- Exato, mas a culpa não é dele. Meu marido foi capturado, há oito dias, por um casal de magos extremamente habilidosos. Eu tentei impedir, mas não pude com a força deles. Só me restou a transformação em um gato para escapar. Lembro-me que estávamos caminhando por uma rua muito bela, recheada de cerejeiras por todos os lados. O casal de magos apareceu de repente, intimando Heter a ajudá-los em uma missão. Disseram algo sobre uma vingança, que Loren Jacobs estava querendo por em prática. Obviamente, meu marido não aceitou ajudá-los, já que há muito tempo nós deixamos de praticar as artes mágicas.
- E ele acabou capturado, e você, refugiada. – Completou Blaze.
- Sim. Passei cinco dias procurando algum meio de encontrar você, menino mais jovem dos Jacobs. Eles querem você, e eu, o meu marido. – Cyka aproximou-se de Razen, que não se atreveu a encarar a maga com a mesma intensidade do olhar dela.
Clay levantou-se e passou as mãos na cabeça, um tanto quanto desesperado.
- Nós vimos Seimic e Margot no farol hoje. Eles devem estar próximos daqui. – Disse, ofegando e caminhando em círculos pela sala. – PRECISAMOS FUGIR!
O grito de Clay silenciou a todos na sala por um instante. Cyka ergueu lentamente a cabeça para olhar a porta, com alguma desconfiança.
- Não... – Disse, com a voz fraca, erguendo os dedos para apontar a porta – Eles estão... AQ- Cyka não pôde completar a frase. Uma explosão catastrófica acontecia nesse exato momento do lado de fora da casa. Com o impacto da explosão, a porta foi completamente despedaçada, e voou por todos os lados da sala em uma chuva de destroços. Blaze, Razen e Clay colocaram os braços na frente do rosto e tentaram se proteger. Cyka transformou-se novamente em um gato, e correu pra trás dos caçadores, tremendo de medo. Uma vasta camada de poeira espalhou-se por todo o cômodo, servindo de premonição para um acontecimento terrível.
Seimic surgiu na entrada nesse instante. Seu terno branco continuava impecável. O homem adentrou na sala, lentamente. Atraindo os olhares de todos, ele disse:
- É chegado o momento do verdadeiro herdeiro dos Jacobs determinar para o mundo inteiro a sua presença. – Passou a língua nos dedos brancos, sendo observado atentamente por Blaze, que mantinha as mãos sobre as armas, aguardando o momento certo. – É claro que os seus fiéis servos darão uma ajudinha, não é? – Seimic fez um movimento rápido com a mão, como se puxasse energia dentro de si para fazer algo. No segundo seguinte, uma pequena luz branca formou-se ao redor de seu punho, formando uma espécie de luva mágica.
O mago sorriu, com uma maldade terrível nos olhos, e atravessou o cômodo velozmente, na direção de Razen. Foi interceptado por Blaze, que esticou a perna no momento exato para acertar o rosto de Seimic, fazendo-o cair com força em meio aos livros e estantes.
- VAMOS SAIR DAQUI, RÁPIDO! – Gritou Blaze, puxando todos pra fora da casa. Mas não havia mais como fugir. Parados em frente aos destroços do táxi de Clay estavam Loren, empunhando uma pequena espada de prata com a mão esquerda, e Margot, agarrada no braço direito metálico do lorde.
- Há quanto tempo... Razen. – Disse o ruivo mais velho, encarando o irmão furiosamente.

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